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Visibilidade Trans

Brasil segue como o país que mais mata pessoas trans no mundo, segundo dossiê divulgado no dia Nacional da Visibilidade Trans

Enquanto a violência persiste, país também está entre os que mais consomem pornografia trans, evidenciando uma contradição social

29/01/2025 21h42
Por: Sara Dutra

No Dia Nacional da Visibilidade Trans, celebrado em 29 de janeiro, é crucial refletir sobre a alarmante realidade enfrentada pela população trans no Brasil. De acordo com o Dossiê: Registro Nacional de Mortes de Pessoas Trans no Brasil em 2024, lançado pela Rede Trans Brasil, o país registrou 105 mortes de pessoas trans e travestis no ano passado. Embora haja uma redução de 14 casos em relação a 2023, o Brasil mantém, pelo 17º ano consecutivo, a triste posição de líder mundial em assassinatos de pessoas trans.

A violência contra pessoas trans segue estruturada pelo preconceito, pela falta de políticas públicas eficazes e pelo alto índice de impunidade. Ainda que avanços legislativos tenham sido conquistados nos últimos anos, o cenário continua preocupante, com ataques diários, exclusão social e dificuldades no acesso a direitos básicos como saúde, educação e trabalho. Muitas dessas mortes ocorrem em contextos de extrema vulnerabilidade, atingindo, sobretudo, mulheres trans e travestis negras, que enfrentam um ciclo de marginalização desde cedo.

Além da violência física, a população trans também sofre com um assassinato simbólico diário: a negação de sua existência e de sua identidade. A dificuldade para conseguir empregos formais empurra muitas mulheres trans para a prostituição como única forma de sobrevivência, aumentando a exposição à violência. A transfobia institucional se manifesta na ausência de políticas públicas eficazes, na discriminação nos atendimentos de saúde e na constante deslegitimação da identidade trans em espaços sociais e jurídicos.

O paradoxo: desejo e preconceito

Apesar dessa realidade brutal, o Brasil também se destaca como um dos países que mais consomem pornografia trans no mundo. Relatórios de plataformas como o “Year in Review” da Pornhub em 2022, indicam que termos relacionados a "transgênero" representam 1,97% de todas as buscas globais, com países como Argentina (4,1%), Brasil (3,42%) e Colômbia (3,11%) apresentando os maiores índices de procura.

Essa contradição revela uma complexa relação social em que a população trans é fetichizada no imaginário coletivo, mas marginalizada e violentamente reprimida na vida real. Enquanto há um alto consumo de conteúdo envolvendo pessoas trans, ainda persiste um estigma que as coloca em situações de vulnerabilidade extrema. O desejo por corpos trans é explorado na pornografia, mas na sociedade, essas mesmas pessoas são alvos de violência, discriminação e exclusão. Esse fenômeno escancara a hipocrisia de um país que consome e lucra com corpos trans, mas não reconhece seus direitos básicos.

A fetichização das pessoas trans também contribui para a construção de estereótipos nocivos. O olhar cisgênero, que consome corpos trans apenas como objeto de desejo momentâneo, ignora a complexidade das identidades trans e reduz suas vivências a fantasias sexuais. Esse fenômeno não apenas reforça o apagamento da individualidade dessas pessoas, como também alimenta um ciclo de violência. Quando a sociedade vê as pessoas trans apenas pelo viés da pornografia, acaba por negar sua humanidade, tornando mais fácil justificar a exclusão e até a eliminação desses corpos na vida real.

Resistência e luta pela visibilidade

Diante dessa realidade, a resistência trans se fortalece. Nesta quarta (29), Brasília  foi palco de importantes manifestações no Dia da Visibilidade Trans, reafirmando a presença e os direitos dessa população. Atos simbólicos, como o hasteamento da maior bandeira trans do país na plataforma superior entre o Conic e a Rodoviária do Plano Piloto, mostraram que a luta por reconhecimento e dignidade não será silenciada. Além disso, manifestações ocorreram em frente à embaixada dos Estados Unidos para denunciar ataques aos direitos LGBTQIA+, da população negra e de pessoas com deficiência, reforçando que a luta trans é interseccional e atravessa diversas camadas da sociedade.

Essas ações fazem parte da Semana da Visibilidade Trans Hanna Suzart, um espaço de luta e reivindicação que busca ampliar o debate sobre a importância da inclusão e do respeito às identidades trans. O evento demonstra que, apesar dos altos índices de violência, a população trans segue resistindo e exigindo seu direito de existir, de ocupar espaços e de viver com dignidade.

A contradição entre a violência e o consumo de corpos trans não pode continuar sendo ignorada. Se o desejo existe, o reconhecimento e o respeito também precisam existir. A luta das pessoas trans não é por aceitação momentânea, mas pelo direito de viver sem medo.

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